Abelha
- Tomás Rosa Bueno
- Feb 3, 2020
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Organizada e laboriosa, a abelha sempre foi, com a colméia, um tema privilegiado da descrição metafórica das sociedades humanas: a mais conhecida é sem dúvida a Fábula das abelhas de Mandeville, da qual Marx disse que "demonstra que os vícios são essenciais e úteis na sociedade de hoje. E isso não constitui uma apologia da sociedade atual”. Mas consideraremos aqui a substância que a abelha elabora e que lhe confere a sua reputação: o mel.
Não é nenhuma surpresa que essa elaboração, por uma síntese misteriosa que transforma a diversidade dos néctares e a transitoriedade dos perfumes em um alimento com virtudes incomparáveis, tenha sempre arrebatado a imaginação dos homens como a própria imagem da atividade do espírito. O simbolismo do mel, quase tão rico quanto o do vinho, está presente na antiguidade grega, assim como na China ou entre os Hopis. Em francês restou a expressão fazer mel de..., no sentido de se aproveitar de uma situação. Mas o que também foi durante tanto tempo o símbolo da generosidade da natureza (ou dos deuses), do que é dado aos homens para aproveitar a vida, obviamente não foi poupado por uma sociedade que se encarniça em corromper tudo, como se quisesse mostrar aos homens que nada lhes é realmente dado, que agora eles precisam conquistar tudo. As culturas industriais, a química não menos industrial que nela se usa, a concentração operada pelas abelhas para produzir o mel, tudo isso é desastrosamente combinado para levar esse "presente celestial do orvalho" à categoria de uma toxicidade bem vulgar e terrestre. É por isso que, se para os Bambaras a verdade é semelhante ao mel, porque é a coisa mais doce do mundo, hoje, pelo contrário, para nós "ela é amarga, é preciso cuspi-la". Assim como a verdade que está no vinho, por exemplo quando é um barbera, é a do veneno, hoje a doçura do mel é aquela, enganosa, dos discursos lisonjeiros com os quais querem nos fazer engolir isso. Em uma sociedade tão falida e tão repulsiva, é de estranhar vermos tanta gente irredutivelmente revolucionária?
Publicado originalmente no nº 7 da revista Encyclopédie des nuisances, em maio de 1986
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